Edição 7 - Theodore John Kaczynski: Unabomber, um radical isolado.
- Tilara Neutzling

- 26 de set.
- 3 min de leitura
Por Tilara Neutzling, Psicóloga Pós-graduada em Investigação Forense e Perícia Criminal
Em uma cabana de madeira, perdida nas montanhas de Montana, um homem solitário escrevia manifestos contra a civilização industrial enquanto preparava bombas em silêncio. Theodore John Kaczynski, o Unabomber, construiu para si um refúgio rústico, sem eletricidade ou água encanada, mas de onde sairia uma das mais longas e enigmáticas campanhas terroristas da história dos Estados Unidos. Não era um fugitivo comum: atrás do isolamento havia um gênio matemático, prodígio acadêmico, transformado em símbolo de como a mente humana pode oscilar entre o brilhantismo e a destruição.
Kaczynski nasceu em 22 de maio de 1942, em Illinois, em uma família católica de classe média. Desde cedo, destacou-se pela inteligência fora do padrão, pulando séries e ingressando em Harvard aos 16 anos. Enquanto os colegas descobriam a juventude, ele já se afundava em cálculos avançados. Essa precocidade, contudo, tinha um preço: isolamento social, dificuldade em se adaptar a grupos, sensação constante de não pertencer. Em Harvard, foi submetido a um experimento psicológico agressivo, onde sofreu humilhações e ataques verbais sistemáticos, experiência que muitos apontam como catalisadora de sua crescente desconfiança em relação à sociedade.
O caminho acadêmico parecia promissor. Concluiu o doutorado em matemática em Michigan e tornou-se um dos mais jovens professores da Universidade de Berkeley. Mas a rotina universitária não o satisfazia. Desconfortável com a vida urbana e com as estruturas sociais, abandonou tudo em 1969. Mudou-se para uma cabana isolada, vivendo de caça, horta e pequenos trabalhos, enquanto mergulhava em leituras críticas sobre a tecnologia. Ali, sem contato próximo com outras pessoas, começou a maturar a convicção de que a sociedade industrial era a raiz de toda opressão.
Entre 1978 e 1995, o silêncio de sua cabana se converteu em ruído de explosões. Kaczynski construiu e enviou cartas-bomba a universidades, companhias aéreas e executivos ligados ao desenvolvimento tecnológico. Ao todo, 16 dispositivos detonaram, deixando três mortos e 23 feridos. Seu método revelava tanto paciência obsessiva quanto frieza: estudava alvos, pesquisava materiais, enviava pacotes camuflados que despertavam confiança. Era um terrorista meticuloso, que trabalhava com o mesmo rigor lógico de um matemático diante de uma equação.
A investigação foi lenta, marcada por frustrações. O FBI criou a sigla “UNABOM” (de University and Airline Bomber) para classificar os ataques, sem imaginar que enfrentava um inimigo isolado e sem rede de apoio. O ponto de virada ocorreu quando Kaczynski exigiu a publicação de seu manifesto, A Sociedade Industrial e Seu Futuro. Ao lê-lo, seu irmão David reconheceu os padrões de escrita e alertou as autoridades. Essa pista conduziu à cabana em Montana, onde agentes encontraram bombas prontas, peças de fabricação e milhares de páginas de anotações.
Do ponto de vista psicológico, o perfil de Kaczynski é intrigante. Ele combinava traços de genialidade com um rígido pensamento paranoide. Muitos especialistas sugerem que apresentava transtornos de personalidade de espectro esquizoide e esquizotípico: introspecção extrema, dificuldade em manter vínculos, desprezo pelas convenções sociais, somados a uma visão conspiratória de mundo. Sua recusa em aceitar o diagnóstico de doença mental durante o julgamento reforçou a imagem de alguém que não se via como doente, mas como o único lúcido em meio a uma sociedade adoecida.
Em 1998, foi condenado à prisão perpétua sem possibilidade de liberdade condicional. Passou décadas em regime de isolamento, escrevendo e mantendo correspondência com acadêmicos, jornalistas e simpatizantes. Nunca abandonou a crença de que estava certo, de que a humanidade caminhava para um abismo conduzido pela tecnologia. Para seus seguidores, era um profeta; para a Justiça, um terrorista.
Ted Kaczynski morreu em 10 de junho de 2023, mas seu eco não desapareceu com ele. O Unabomber deixou um legado ambíguo: ao mesmo tempo em que expôs a vulnerabilidade de instituições poderosas frente a um indivíduo isolado, também revelou até onde pode ir a radicalização quando a inteligência se fecha em si mesma. Sua história é o retrato de um paradoxo humano: a mente capaz de decifrar padrões matemáticos complexos foi a mesma que se dedicou a transformar o ódio em pólvora e metal.









Comentários